terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Até já

"Temos de arranjar tempo para nós". Foram estas as últimas palavras que ouvi de ti, em mais uma das mil conversas diárias que tínhamos. "Temos de arranjar tempo para nós", dizias tu depois das mil tentativas falhadas de jantares, lanches ou meros cafés. "Temos de arranjar tempo para nós" e esse tempo não chegou.
"Primeiro estranha-se e depois entranha-se", foi assim que te referiste à nossa amizade alguns anos depois de nos termos tornado inseparáveis. A afinidade, a cumplicidade, o amor incondicional que construímos, muitas vezes incompreendido pelos outros, a genuinidade que transmitimos, é aquilo que melhor nos caracteriza. E sim, estou a usar o presente e não o pretérito porque para mim continuas no mesmo lugar. Quero continuar a fechar os olhos e a ouvir as tuas gargalhadas, assim como o teu sotaque, com o qual tantas vezes brinquei. Quero continuar a fechar os olhos e sentir a tua mão no meu rosto, a mão que tantas vezes me confortou e me enxugou as lágrimas. No fundo quero apenas continuar a sentir-te.
Eras conhecida pelo teu corpo pequeno e magro e pelos teus grandes olhos. Os teus olhos...como esquecê-los? Escondias neles a menina-mulher cheia de sonhos, de objectivos, de esperança. No dia-a-dia mostravas o teu profissionalismo, a tua competitividade, a tua garra. E não era nada fácil gostar de ti e tu sabia-lo. Intrigavas as pessoas à tua volta, eras alvo de inveja e cobiça mas isso nunca te fez desistir. Eras misteriosa e era isso mesmo que nos cativava a todos e nos fazia correr atrás só para ter mais um bocadinho de ti. Hoje, infelizmente esse mistério perdeu-se.
Hoje perde-se uma mulher, uma filha, uma irmã, uma namorada e uma melhor amiga. Mais do que isso perde-se um ser humano maravilhoso que apesar da sua curta missão, deixou marcas em cada vida pela qual passou. E apesar da nossa revolta, das nossas intermináveis perguntas sem resposta perante este amargo destino, resta-nos apenas aceitar.
Hoje dizemos-te até já e não adeus, isto porque para todos nós que te conhecemos, que ficámos com um bocadinho de ti, torna-se impossível algo tão definitivo e sem retorno. Ensinaste-nos com a tua partida algo muito importante. Que o tempo é precioso e deve ser tratado como tal. Quando alguém nos disser "Temos de arranjar tempo para nós", o melhor é corrermos, porque um dia sem darmos conta o destino rouba-nos e esse tempo acaba.
Até já.